Se um dia a juventude voltasse


"se um dia a juventude voltasse
na pele das serpentes atravessaria toda a memória
com a língua em teus cabelos dormiria no sossego
da noite transformada em pássaro de lume cortante
como a navalha de vidro que nos sinaliza a vida

sulcaria com as unhas o medo de te perder... eu
veleiro sem madrugadas nem promessas nem riqueza
apenas um vazio sem dimensão nas algibeiras
porque só aquele que nada possui e tudo partilhou
pode devassar a noite doutros corpos inocentes
sem se ferir no esplendor breve do amor

depois... mudaria de nome de casa de cidade de rio
de noite visitaria amigos que pouco dormem e têm gatos
mas aconteça o que tem de acontecer
não estou triste não tenho projectos nem ambições
guardo a fera que segrega a insónia e solta os ventos
espalho a saliva das visões pela demorada noite
onde deambula a melancolia lunar do corpo

mas se a juventude viesse novamente do fundo de mim
com suas raízes de escamas em forma de coração
e me chegasse à boca a sombra do rosto esquecido
pegaria sem hesitações no leme do frágil barco... eu
humilde e cansado piloto
que só de te sonhar me morro de aflição"


Al Berto - Se um dia a juventude voltasse

5 comentários:

do Zambujal disse...

Não conhecia... e gostei muito.
Do poema e da foto!
Obrigado.

Um abraço, João... e mais um abraço que ficou por dar aqui há uns dias.

Graciete Rietsch disse...

Que lindo poema e como eu o sinto.

Um abraço.

Fernando Samuel disse...

Excelente fotografia.

Um abraço.

Fernando Samuel disse...

Excelente fotografia.

Um abraço.

GR disse...

Sim, a fotografia é magnífica!

Bjs,

GR