PARA ALÉM DOS VALORES DE ABRIL


É com o 25 de Abril de 74 que se liquida a ditadura fascista abrindo caminho para a materialização das reivindicações populares que há muito se exigiam. No contexto de então foi possível aos trabalhadores imporem um conjunto de cedências à burguesia criando um espaço onde o desequilíbrio favorecia de facto trabalhadores e não o capital. As cedências então feitas, foram recuperadas pelo capital. Entre alguns dos valores de Abril alcançados destacamos o início da Reforma Agrária, a liberdade de reunião, associação e manifestação, a liberdade de organização política, o fim da guerra colonial, entre outras conquistas (ver quadro).
Contudo, o Estado da burguesia não foi inteiramente desmantelado, e não houve alterações no modo de produção vigente. Mesmo as nacionalizações não resolveram o problema do poder (1).
Mais de quarenta anos volvidos do 25 de Abril, colocam-se 2 pontos essenciais aos comunistas: por um lado a caracterização do regime em que vivemos, claramente reconstituído como capitalismo monopolista de Estado e por outro, qual o papel de um partido comunista, marxista-leninista, perante tal regime.
Os marxista-leninistas e os seus partidos comunistas visam criar condições revolucionárias, condições que levem a uma situação revolucionária. Não será seguramente mitigando o capitalismo que os comunistas vão criar essas condições. Não será igualmente através da chamada paz social e da conciliação de classes  - que implicam o silêncio e engano dos explorados e oprimidos - que os comunistas exercem o seu papel. Tais soluções seriam “contra o código genético” de qualquer marxista-leninista. Aproveitando todos os espaços para actuar sobre a realidade, os comunistas usam o parlamento para desmascarar a democracia burguesa e a ditadura do capital mas sem quaisquer ilusões sobre o mesmo.
Os comunistas não têm qualquer reverência pelas instituições da democracia burguesa, que querem desacreditar e fazer ruir, erguendo a democracia socialista. Os marxistas-leninistas não confiam nelas, não têm quaisquer ilusões sobre elas. A justiça é sempre de uma classe. A democracia é sempre de uma classe. O poder é sempre de uma classe sobre a outra. A nossa relação com as instituições do poder burguês deve ser de combate permanente, sem levar para dentro delas uma solução das contradições entre capital e trabalho que de lá nunca sairá.
Em mais um aniversário da Revolução de Abril, cabe aos comunistas continuar a criar condições revolucionárias: pondo a nu a conflitualidade com a classe dominante, dinamizando a luta de massas, mobilizando a classe, parando a produção como forma de luta, desestabilizando as instituições burguesas quando há condições para tal, dirigindo os operários e trabalhadores num processo crescente de radicalização até à Revolução Socialista.
Não aceitamos a tese trotskista do programa de transição (Trotsky 1938c), definindo um conjunto de reformas intermédias, estágios e fases, que numa “escada” muito certinha caminham até ao socialismo. Estas teses são estranhas a um movimento comunista que quer ir à raiz dos problemas sociais.
Os programas dos partidos comunistas e o socialismo vão muito para além dos valores de Abril porque implicam de facto a ruptura com este sistema. Somos e seremos comunistas. E o objectivo dos comunistas não é mitigar os abusos do capitalismo: é destrui-lo.

Com Abril em mente, na senda do socialismo e do comunismo.


(1) Como diz o Programa do nosso Partido, “A revolução portuguesa apresenta como valiosa experiência o facto de, numa situação revolucionária, mesmo não dispondo do poder político, as massas populares em movimento e em aliança com o MFA terem podido transformar profundamente a sociedade, empreender e realizar profundas reformas das estruturas socioeconómicas, influenciar e condicionar o comportamento do poder político e contribuir para a consagração legal dos avanços revolucionários.
Os anos ulteriores mostram também a extraordinária capacidade das massas para resistir à contra-revolução mesmo quando desencadeada e desenvolvida pelo poder político.
Mas a experiência confirma também que a questão do poder acaba por determinar o curso da política nacional.”

(2) “A tarefa estratégica da IV Internacional não consiste em reformar o capitalismo, mas em derrubá-lo. Seu objetivo político é a conquista do poder pelo proletariado para realizar a expropriação da burguesia. Entretanto, o cumprimento desta tarefa estratégica é inconcebível sem a mais atenta atitude em todas as questões de tática, mesmo as pequenas e parciais.
Todas as frações do proletariado, todas as camadas, profissões e grupos devem ser levados ao movimento revolucionário. O que distingue a época atual não é o fato de ela liberar o partido revolucionário do trabalho prosaico diário, mas o de permitir conduzir esta luta em união indissolúvel com as tarefas da revolução.
A IV Internacional não rejeita as reivindicações do velho programa mínimo", à medida que elas conservaram alguma força vital. Defende incansavelmente os direitos democráticos dos operários e suas conquistas sociais. Mas conduz este trabalho diário ao quadro de uma perspectiva correta, real, ou seja, revolucionária. A medida que as velhas reivindicações parciais mínimas" das massas se chocam com as tendências destrutivas e degradantes do capitalismo decadente - e isto ocorre a cada passo -, a IV Internacional avança um sistema de REIVINDICAÇÕES TRANSITÓRIAS, cujo sentido é dirigir-se, cada vez mais aberta e resolutamente, contra as próprias bases do regime burguês. O velho programa mínimo" é contentemente ultrapassado pelo PROGRAMA DE TRANSIÇÃO, cuja tarefa consiste numa mobilização sistemática das massas em direção à revolução proletária” (Trostky, L. 1938, in O Programa de Transição)

(As letras maiúsculas correspondem ao documento como está na internet)


OS VALORES DE ABRIL*
Liberdade de expressão e de pensamento sob qualquer forma
Liberdade de manifestação
Liberdade de reunião e associação
Liberdade de organização política
Liberdade sindical
Salário mínimo nacional
Igualdade de direitos
Eleições livres
Direito de votar com mais de 18 anos
Direito à justiça
Independência e dignificação do poder judicial
Direito à educação
Direito à cultura
Direito à habitação
Direito ao trabalho
Direito à reforma
Direito à saúde
Direito à greve
Controlo operário
Nacionalizações
Reforma agrária
Poder local democrático
Política económica democrática e estratégia antimonopolista
Política social essencialmente na defesa dos interesses da classe trabalhadora
Aumento da qualidade da vida de todos os portugueses
Lei do arrendamento rural e dos baldios
Fim da guerra colonial
Política externa orientada pelos princípios da independência e da igualdade entre os estados, na não ingerência nos assuntos internos dos outros países e da defesa da paz
Participação dos portugueses na vida pública nacional garantindo, pelo seu trabalho e convivência pacifica, qualquer que seja a posição social que ocupem, as condições necessárias à definição, de uma política que conduza à solução dos problemas nacionais e à harmonia, progresso e justiça social indispensáveis ao saneamento da vida pública e à obtenção do lugar a que Portugal tem direito entre as nações
*da intervenção de José Casanova no aniversário de Vasco Gonçalves.

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